Falando sobre o medo do fracasso
Antes de seguirmos em frente e falarmos de minhas estratégias para trazer mais atenção à tradução técnica nos projetos da Wikimedia, preciso tocar em um assunto que muito provavelmente afeta todo ser humano: o medo do fracasso. Como escrevi no dia 2 de janeiro em minhas notas diárias, há alguns dias fui tomada por apreensão e inquietude pois comecei a sentir o peso de minha responsabilidade como estagiária e a questionar até que ponto eu poderia falhar. Apesar de estar ansiosa para colocar os meus conhecimentos e aprendizados em prática, temia cometer erros e não obter o sucesso esperado. O que acontecerá se eu não encontrar a solução perfeita, se todas as minhas ideias forem infrutíferas?
Expressei os meus medos e inseguranças a Johan e Benoît em nossa última reunião e eles, sendo os bons mentores que são, lembraram-me de vários aspectos importantes da natureza do meu projeto e da vida profissional como um todo:
Este não é um projeto como os outros
Enquanto definir resultados esperados para projetos que envolvem a implementação de uma determinada funcionalidade em um software é um processo fácil, para um que se propõe a encontrar novas estratégias de recrutamento de contribuidores isso é um tanto mais complicado. É injusto esperar que eu resolva todos os problemas relacionados à tradução técnica na Wikimedia Foundation em três meses de atuação, e não é realista ter a expectativa de que os cursos de ação que eu propor darão certo a ponto de podermos definir metas em termos de números de novos tradutores e aumentos da porcentagem de documentação traduzida em cada idioma. Isso nos leva ao segundo ponto:
Este é um projeto focado em pesquisa
Como em qualquer outra pesquisa em qualquer outra área, resultados tidos como “negativos” continuam sendo bons resultados dada a possibilidade de aprendermos tanto com falhas quanto com sucessos. É por isso que, além de pretender escrever um relatório final sobre as minhas experiências, impressões e recomendações, proponho-me a documentar o meu trabalho o máximo que posso — dessa forma, é possível entender melhor os caminhos que me levaram àquelas conclusões.
A decisão perfeita não existe
Quando os nossos planos falham, tendemos a pensar que as outras opções que tínhamos à disposição no momento de decisão poderiam ter nos levado ao sucesso. E enquanto é natural reavaliar o nosso processo de deliberação, não é nada saudável ficarmos obcecados pela fantasia da possibilidade. A decisão que tomamos em determinado instante é, muitas vezes, a melhor que poderíamos fazer. Agimos levando em conta as informações disponíveis e nosso melhor julgamento no momento.
“Você poderia, por exemplo, ser atropelada por um ônibus se escolhesse outra coisa”, disse-me Johan. Isso pode parecer cínico e demasiadamente absurdo, mas é uma colocação bastante apropriada. Não há nada, absolutamente nada, que lhe garanta que as outras opções teriam sido melhores escolhas.
Ser flexível é preciso
Tomar uma decisão não significa necessariamente tornar-se devoto a ela. É uma boa ideia estabelecer uma rotina de avaliações para checar se você se encontra na direção certa para atingir os seus objetivos, e não há nada de errado em reconsiderar outras opções ainda que se tenha investido muito tempo. No desenvolvimento de software, inclusive, esse é um dos pontos centrais da tão falada (e extensivamente usada) metodologia ágil.
Novamente, é importante salientar que testar opções e reconhecer que elas são falhas não significa desperdiçar tempo e recursos. Toda ação é uma oportunidade de aprendizado e o resultado sempre será se tornar uma pessoa mais consciente, experiente e sábia.
A responsabilidade é compartilhada
Não estou só — eu e os meus mentores somos uma equipe. Tomamos ação apenas após dialogarmos um com os outros e chegarmos a um consenso. Se eu não concordar com algo, sou livre para expressar o meu ponto de vista e contra-argumentos. Se as minhas ideias não tiverem fundamento algum ou forem algo que já foi feito e fracassou, eles me comunicarão disso.
Essa atitude acaba criando uma rede de suporte. Não é esperado de mim que eu carregue o peso das decisões (e as suas consequências) sozinha. “Nós estamos contigo, não se preocupe”, ambos me disseram.
Como uma pessoa que tem assistido aos poucos o mundo da tecnologia desumanizar aqueles que trabalham na área com exigências de cargas horárias e prazos cada vez mais absurdos, a possibilidade de poder ser sincera sobre os meus sentimentos e conflitos com as pessoas que estão me mentorando é com certeza um dos aspectos mais importantes da experiência que estou tendo neste estágio.
O processo de crescimento — ou, ainda melhor, de florescimento — envolve muito mais do que ter oportunidades de colocar as suas habilidades em prática ou pessoas que acreditam no que você pode oferecer. Ele exige, principalmente, uma enorme compreensão da natureza humana e um imenso respeito pelos seus limites. E é acalentador vivenciar tudo isso enquanto trabalho com a Wikimedia Foundation.