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[Outreachy] · · 5 min de leitura

Alguns pensamentos soltos sobre redes sociais comerciais

Nota: este texto é mais um desabafo do que qualquer outra coisa. Ainda pretendo escrever de forma mais séria sobre a minha percepção das mudanças provocadas pelas redes comerciais, mas não hoje.

“Os ciclos de reposta curtos e impulsionados por dopamina que criamos estão destruindo a forma como a sociedade funciona. [Não há mais] diálogo civil, cooperação; [apenas] desinformação, inverdades.” — Chamath Palihapitiya, ex-executivo do Facebook

Realmente gostaria de começar este texto falando sobre como não tenho um perfil no Facebook há anos, mas todos nós sabemos que isso não é verdade. Apesar da minha escolha de excluir a minha conta, a empresa de Mark Zuckerberg nunca deixou de saber quem sou, como vivo ou com quem me relaciono. Como uma rede social com o objetivo de coletar informações com o maior nível de fidelidade à realidade possível, é bem sabido que o Facebook incentiva que o usuário os entreguem a sua lista de contatos e aplica políticas controversas como a do nome verdadeiro. Então a minha saída, no fim, talvez tenha sido mais um ato simbólico do que uma ação efetiva para retirar os meus dados de lá.

A minha insatisfação com o Facebook e tantas outras redes sociais contemporâneas, porém, origina-se não só do seu uso de dados pessoais mas das grandes mudanças na maneira como vemos o mundo, mensuramos o nosso valor, interagimos com outros usuários e nos conectamos com pessoas.

Por exemplo, uso o Twitter há quase dez anos — possivelmente é a rede social que mais usei durante a minha vida inteira. Eu me lembro…

E é com muita tristeza que constato que isso não corresponde mais à realidade atual.

Sinto-me até melancólica ao revisitar essas lembranças porque, quando era mais nova, acreditava que esses produtos eram desenvolvidos em prol dos usuários. Ficava revoltada quando introduziam novas funcionalidades que jamais havia requisitado e era bastante vocal quando insatisfeita. “Essa rede social só existe com sucesso por nossa causa”, pensava. “Eles precisam de nós para sobreviver, então precisam nos ouvir, certo?”.

Errado.

Como eu disse, uso o Twitter há quase dez anos. Continuo voltando para lá, apesar de tudo. Porque…

  • todo mundo está lá. Se eu virar as costas para o Twitter, estarei me distanciando com múltiplas amizades, pessoas importantes, contatos preciosos.
  • … eu posso estar perdendo alguma coisa. Um anúncio importante, uma oportunidade profissional, uma notícia que irá mudar o mundo.

Instagram, Facebook, Twitter, Whatsapp, LinkedIn: esses produtos já se estabeleceram como referências em nosso cotidiano. Precisamos ser vistos. Precisamos ser lembrados. Então, no fim, não são eles que precisam de nós — tudo isso, aos poucos, se tornou imprescindível aos nossos olhos.

Então aceitamos ser mensurados e julgados por métricas. Nos sentimos ansiosos por isso, mas ainda há benefícios, não? Aquela piada engraçada, aquela polêmica imperdível, aquela conexão com aquele primo de terceiro grau com quem brincamos uma vez durante a infância e provavelmente nunca teremos uma conversa de novo, mas se for preciso, está ao nosso alcance. Permitimos que eles escolham o que é mais relevante para nós. E por mais que isso tenha consequências assustadoras…

… deixamos isso passar. E, conforme passamos mais tempo entretidos nesses mini mundos, perdemos a conexão com um universo mais diverso.

Dizer que isso é uma barreira para eu fazer o meu trabalho como estagiária Outreachy é um eufemismo.

Escolher não fazer parte dessas redes sociais significa, em certo grau, vivenciar um isolamento social. Ao invés de serem acessíveis através de meios de comunicação mais universais como telefone ou e-mail, pessoas priorizam a atenção a interações em plataformas fechadas. Para alcançá-las, você precisa jogar conforme as regras dessas redes comerciais — e muitas vezes, elas serão invasivas.

Nova funcionalidade do Facebook para confirmar a identidade dos usuários. Sem selfie para eles? Sem conta para você.

E ainda que você faça concessões, nada lhe garante que você terá acesso àquela audiência. Alcance orgânico é algo em declínio. Você precisa construir uma reputação, uma forma de conversar com o público, uma identidade visual incrível. Atingir um número grande de pessoas com estratégias escaláveis consome tempo e energia inacreditáveis, e há pouco espaço para improvisos.

Então essa constante busca por maneiras de alcançar pessoas para cumprir o meu trabalho fez com que eu, mais uma vez, questionasse muitas das minhas escolhas e opiniões. Estou exagerando tudo isso? Estou me preocupando com as coisas erradas? Por um lado, essa dependência generalizada de redes comerciais faz com que eu sinta a minha existência lentamente desaparecer toda vez que me recuso a fazer parte disso, e é algo que me assusta. Por outro, até que ponto é aceitável ignorar o meu desconforto em prol de um status social cada vez mais difícil de alcançar e que exige uma manutenção exaustiva?